domingo, 4 de julho de 2010

 

RELEITURA DA VIDA

Revendo alguns documentos, livros e escritos, me encontro comigo mesmo há vinte anos. O que pensava ou pensei, o que sentia ou o que senti, me revela muitas vezes algo de mim que nem mesmo lembrava (ou fiz questão de esquecer). Consola-me o fato de saber e constatar que já fui puro. Um jovem apaixonado que encontrava nas palavras de rimas “pobres e fáceis” um meio de espantar seus demônios e medos. Acima de tudo, me evidencia a capacidade que sempre tive de refletir sobre a vida e de questionar valores, sejam morais, éticos, culturais ou religiosos... É parte de minha história. História essa que tento reescrever e resgatar, na tentativa de avaliar o quanto me mantive firme em meus propósitos e caráter. Acho que vale o registro.



ENCONTRO COM O PAI (escrito em 12.02.1990)

Quando estou só, lembro tanto de mim. E me espanto em sentir que somos dois... assim.

Um, sou o “eu” agora. Correndo lá fora, gritando, apostando para ser feliz. Tentando acertar na vida, tapando a ferida, apertando a barriga. Sufocando a dor. Pai, querendo amor. Mas sem ser, por favor.

O outro sou eu, ou fui um dia. Criança que ria, ia, queria, vivia, sentia. O garoto de ontem cresceu no homem de hoje? E eu os vi ao longe, unidos por um sonho. Separados por ideais. Morrendo em paz. Calados, não audaz. Braçais? Jamais! Trôpegos? Santos? Sonhos tantos, agonias e prantos.

Porém o homem não se achou no garoto. Mas é homem. Hoje e amanhã. E ontem? O garoto sonhou mil viagens, correu vários mares... E o homem fantasia poucas, agonias loucas, em falas roucas. O home hoje, o garoto ontem. Solidão amanhã. A mente sã? Numa dor pagã, quando o homem sonha renasce o menino em si. Porém quando sonha o menino, morre o homem. Numa morte lenta, força que tenta viver em comunhão. Compaixão... Meu “pai” perdão.

Não consigo viver, lutar e vencer. Tragar a vida e o medo beber. E se eu te perder? Se é que um dia o tive. Ensina-me, oh, pai. Não como garoto que sou, mas como homem que tento ser. A amar-te, adorar-te e também a perdoar-te. Pelo respeito que perdi. Te juro não pretendi. Não te entendi. Também não me entendesses, a paciência perdesse? Não me aceitasses. Chingasses. Feriste um filho, partisses um trilho. Interrompesses o trem da minha vida. Hoje andas na frente (em minha mente). Ou atrás? Pai, onde estás?

Como garoto de procuro, como homem me escondo. Em teu olhar me torturo. Teu ser, puro? Tortura, tua altura que não consigo atingir. Queria agir. Te pedir ajuda. Tua voz aguda, profunda “ao dizer meu filho”, não ouço mais.

E ao olhar pra trás, no homem encontro o menino. A procura do trilho. Porque és (sou, somos) tão complicado. Não entendesses o recado do mar? Não sou “errado”. Preciso me (te) encontrar. Tento te amar. Meu trilho encontrar para que de tua morte, um garoto forte ador suporte. A dor...

Não te quero pouco, mas pai que sufoco não poder te falar, gritar e não chorar. O menino e o homem, partes integrantes do mesmo ser. Querendo, contudo, o que não conseguistes ter. O não preconceito. Sem conceitos, meus defeitos. Viver um desejo e morrer num beijo. Do menino no homem. Prá daí, partir, jamais repartir. O home só surge com o fim do garoto. Então preciso, encontrá-lo por isso. Percorrer esse trilho até o fim. Para que assim termine seu percurso normal. Prá daí surgir o homem atual. Que sou eu. Com meu jeito, trejeitos e com ar nos peitos respirar por mim.

Ser homem sim. Ser homem assim, e fim!



NARCISO (escrito em 11.03.1991)

Vejo um corpo em minha frente. 
Sinto um homem em minha mente. 
Percebo-me quente, contente. 
Este homem ri e eu o acompanho, num sorriso estranho. 
Ao vê-lo me espanto, e em seus meigos olhos me encanto. 
Em seus braços leigos me encontro. 
Este homem que me persegue, é o mesmo ser que me ergue. 
Em minha boca, a língua se embebesse, o peito enrijece. 
Braços fortes me aquecem até que o orgasmo acontece. 
Assusta-me admirá-lo, encará-lo, e até mesmo, adorá-lo. 
Porém sempre o vejo, desejo e procuro. T
ortura-me querê-lo. 
Não poder tê-lo, real.
Este homem que repete o que falo e que diz sempre o que digo. 
Cala-se quando calo, e que briga quando brigo. 
Olha por meus olhos. 
Se banha se me molho.
Este homem a quem desejo. 
E a quem tanto me assemelho. 
Em meio a alucinações percebo, que o sou no espelho.



QUANDO EU TE CONHECER


Quando te conhecer, te direi meias verdades
Mas, não saberais das saudades que sinto, pressinto,
Ao desmentir meu amor a ti.

Ao te abraçar e esquecerei de mim
E morrerei no sem fim de teus cabelos
Na saudade beijarei teus pêlos, e te farei mil apelos
Insensato, entregarei meus selos
Deixarei que me entres e me vivas,
Prá depois abrir feridas sentidas

Nunca saberá que toda verdade é que amo,
E que quando nas noites te chamo, proclamo que me tenhas,
Que me venhas e enlouqueças,
Me vires a cabeça, me embriague em tua calma.

Não te falarei de mim
Pois que nosso tempo não se fará eterno
E a culpa me lançará no inferno, até o frio congelar minha alma
Perdoarei as saudades para por fim me entregar a ti.

Nesse momento nada mais importará
Pois o único tempo que me matará, será gasto contigo
E quando teu peito amigo, do meu se afastar
Sozinho, chorarei minhas mágoas
E me lançarei em águas profundas e escuras
Me direi as palavras mais duras
E viverei do meu próprio penar

Depois chorarei os mares, falarei aos ares
Que o amor a ti não foi em vão
Contudo, não me pedirei perdão
Por não desvencilhar-me de mim mesmo
E por medo não viver o desejo
Que tive e tenho de te deixar me conhecer.



TEMPO


Com que direito me entras na vida
Me invades a alma e me fazes sofrer?
Tempo que me és tormento
Sussurro violento, que não enfrento
Me fechas os olhos e me abres sentimentos
Ao me lançar no absurdo que é o amor

Se não conheces minha dor
Porque te vingas de mim com toda tua ira?
Lanças então, uma chama que me fira
E num simples sopro a vida me tiras
Prá que eu siga em paz.
És tu tempo que me desespera
E na ânsia da espera amedrontas e alucinas, crucificando meu ser

Tempo que não me é amigo
Agora me negas abrigo e brincas com meu sofrer
Sem meu amor te entrego minha sorte
Meu acalanto será a morte,
Pois que a ela cantarei meu pranto
E no escuro sinistro de seu manto
Findarei meu viver.



DESENCONTROS


Se me procuras, te encontro
Enlouqueço de paixão
Vivo o simples pensamento de teu corpo
Depois agonizo em tormento
E te imploro compaixão

Se me pedes, te entrego
Descubro-te junto a mim
Envolvo-te, rasgo o verso
E em juras te confesso
Não saber viver sem ti

Se me prendes, tu me rendes
Levas-me ao fundo do querer
Engulo-me em tua boca
Alucinas-me de prazer
Vibro ao toque da tua pele
Imploro que me prendas e me leves
Fazes-me suplicar, que na loucura do ter ser
Não me deixes de amar

Se te procuro, não me encontras
Me entregas a ilusão
Passa perto não me tocas
Condenas-me a solidão
Não me ajudas nem me olhas
Cospes-me um beijo
Aniquilas meu desejo
Não me concedes compaixão


Se te peço, não te entregas
Desmentes-me teu amor
Nem ao menos me desprezas
Nem mesmo me concedes promessas
De libertar a minha dor
Se te prendo, não me rendes
Somes quando presentes
Quando me ponho em tua frente
E imploro teu amor

Mas se o meu amor renegas
Se tua compaixão me negas
Então porque, oh deus
Simplesmente não me cegas
E condenas-me a escuridão.
E em enlouqueces prá que não sinta
Me matar essa paixão





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