quinta-feira, 31 de maio de 2012

AS MULHERES DE MAIO







MULHERES QUE FAZEM A HISTÓRIA



Maio é o mês das noivas, mês das mães, mês da mulher. Quinto mês do calendário gregoriano demarca a chegada da primavera. Maio se escreve com “M” assim como mulher. Neste sentido, torna-se símbolo de luta e batalhas sociais. Desta forma, nada mais oportuno do que terminá-lo destacando algumas mulheres que fizeram, atualizaram, escreveram ou reescreveram a história, pessoal e nacional, durante o maio de 2012.

Depois de mais de quarenta anos, a apresentadora e eterna “Rainha dos Baixinhos”, Maria das Graças Meneghel – a Xuxa - revelou em cadeia nacional uma infância e adolescência marcada por um tipo de violência que a sociedade faz questão de manter em silêncio. Vitima de abuso sexual até os 13 anos, afirmou saber o que uma criança sente quando é violada em sua intimidade e inocência. A notícia reacendeu a discussão e contribuiu para aumentar o número de denuncias sobre um fenômeno que não é apenas nacional, mais mundial, e acomete milhares de crianças, incluindo meninas e meninos, cotidianamente. Também dividiu opiniões da sociedade, que mais uma vez revelou o despreparo no trato da temática. Acusada de oportunismo por alguns, desacreditada por outros, difamada por tantos mais, Xuxa tornou-se mais uma vez vítima da violência. Sites da internet dispararam em reeditar cenas de um antigo filme onde a atriz [e não a pessoa] aparece em cena erótica com um adolescente. As salas de bate-papo abriram debates a respeito da integridade pessoal e conduta moral da apresentadora, mas não discutiram o tema em foco. Jornais e revistas aproveitaram o “furo de imprensa” para ampliar suas vendas. Até parlamentar quer seu depoimento em CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] sobre abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. Se a acusação é de oportunismo, talvez fosse necessária uma maior reflexão sobre quem, neste caso, se configura como real sujeito da ação.

Na verdade, o depoimento de uma das mulheres mais famosas do Brasil, reabre a velha discussão sobre até que ponto a eroticidade e a sexualidade das pessoas, consideradas por alguns preconceituosos e despreparados como “exacerbadas” ou “fora do normal”, tornam-se convites ou espaço de autorizo para a violação. A vítima, neste caso, passa a ser culpabilizada, respondendo pela agressão sofrida. Torna-se a vilã de uma história que não escreveu. Talvez seja a maneira ou forma mais rápida que a sociedade tenha encontrado para purgar suas próprias responsabilidades e negligências. Talvez seja reflexo de nossa cultura machista, onde mulheres e crianças ainda são vistas como não sujeitos de direitos, e por isso, passíveis de subjugação. Mas, talvez, seja apenas resultado do comprometimento de nossa educação de base, que nos impossibilita as análises próprias, e nos torna repetidores de opiniões alheias. Independente disso, Joana Maranhão, atleta pernambucana e vencedora de medalhas, também revisitou sua história em cadeia nacional, nesta última terça-feira, 29 de maio, para ampliar a discussão sobre a necessidade de medidas mais eficazes sobre o enfrentamento ao abuso sexual, e principalmente eficiência no atendimento das vítimas. Entra para a história por ter provocado a alteração da lei que passa a estabelecer que a prescrição do crime passe a contar a partir da maioridade da vítima, e não mais a partir da data do crime. É assim que se contribui para o desenvolvimento de uma sociedade, ainda que seja necessário se expor e reviver os traumas. No mesmo rastro as meninas do bairro de Jardim São Paulo trazem a tona o despreparo das instancias governamentais ao expor o esquema de exploração sexual contra crianças e adolescentes dentro do Complexo Carcerário Aníbal Bruno, comandado pelo grupo de extermínio Thundercats. Será que os responsáveis legais também serão convocados para depor na CPI? Neste caso, melhor deixar como dica!

No mesmo mês, a atriz Carolina Dieckman teve sua intimidade devassada por internautas oportunistas e inescrupulosos. Os sites pipocaram com as fotos íntimas de uma profissional séria e mãe de família. O mais impressionante foi verificar as próprias mulheres, principais vítimas da modalidade de violência sexual, enviar e distribuir as fotos na rede social. Algumas ainda se acharam no direito de fazer avaliações sobre sua performance, acrescentando opiniões do tipo: “esperava mais!”. Talvez a atriz também esperasse, no sentido de cumplicidade e respeito, afinal de contas qualquer um está sujeito a esse tipo de violação. Carolina também entra para a história, não como pornográfica, mas como mulher consciente de seus direitos, revelando para o país que a justiça, apesar de desacreditada, ainda pode funcionar. Neste sentido, acredito ser interessante e necessário destacar aos desavisados que a exposição involuntária do corpo alheio também se configura como crime sexual, e que muitas vezes, a simples curiosidade, e até mesmo nossos mais inconscientes desejos perversos nos alça a condição de infrator e delinquente. Não se combate a pornografia, modalidade da violência sexual, e por conseqüência as redes de exploração sexual, divulgando ou repassando “fotos sexys”, principalmente quando estas são do campo do privado. Vale mais uma dica!

Outra mulher que entra para a história é a piloto de avião Betânia Porto Pinto, que na semana passada foi surpreendida por um passageiro que se negava a seguir viagem pelo simples fato da comandante ser mulher. Abrem-se mais uma vez as discussões relativas à igualdade das capacidades físicas e intelectuais entre homens e mulheres para assumirem determinados postos de trabalho. A situação não é tão diferente quanto à de Dilma Roussef, primeira mulher a assumir a presidência da república em nosso país tupiniquim. Violência não é só a que deixa marcas no corpo. Assédio moral também provoca e deixa sequelas. É preciso entender, que no Brasil a violência assume proporções e formas plurais. Não é possível que uma profissional com mais de 20 anos de carreira e mais de nove mil horas de vôo passe ainda por situações tão constrangedoras. Assim como Dilma enquadrou neste mês os ruralistas e enfrentou os banqueiros na luta pela redução dos juros, a piloto mineira mostrou-se conhecedora de seus direitos e do seu papel de cidadã. Por falar nisso, o certo é “a piloto” ou “pilota”? Será que levaremos tanto tempo para designá-la enquanto mulher quanto estamos levando com o uso do termo “presidenta”? Será que a reflexão serve como dica?

Também nesta semana, a modelo brasileira Lea T, recentemente transgenitalizada, revelou ainda está se adaptando a sua nova condição de mulher. Entra para a história por vencer o preconceito, trazendo à tona a tão discutida e polemizada cirurgia de transgenitalização [ou cirurgia de redefinição sexual] no mesmo mês que o Hospital das Clínicas de Pernambuco anuncia a paralisação das cirurgias no estado devido à falta de especialistas na área. E neste caso, é preciso que se explique que com a aposentadoria do Doutor e Professor João Sabino Pinho Neto, responsável pela equipe médica que realizou 22 cirurgias de transgenitalização nos últimos anos, não se dispõe, no Norte-Nordeste, de profissional que possa assumir o posto. Destaca-se, contudo, a existência de negociações em andamento para que tais cirurgias sejam custeadas pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Agora é esperar [e pressionar] para que o fato não entre para a nossa história como marco do retrocesso.

No cenário da luta pelos direitos humanos, mais uma mulher a entrar para a história [não só da teledramaturgia] será a “meio mocinha-meio vilã”, Suellen, personagem de Ísis Valverde, em Avenida Brasil, novela das oito horas, da Rede Globo. Pela primeira vez a novela brasileira tratará a temática do tráfico de seres humanos para fins de prostituição. É que a personagem tem origem boliviana e está no país de forma ilegal, agenciada por um cafetão. Desta forma, Suellen tem como missão apresentar para o público o sofrimento e os dilemas de uma pessoa vítima das redes do tráfico de seres humanos, que será mantida, inclusive, em cárcere privado. É esperar para ver e acreditar que a temática da violência sexual seja mais adequadamente desenvolvida do que foi em “Passione”.

Por fim, destacando a excelente iniciativa do Governo do Estado de Pernambuco com lançamento do Programa Pacto Pela Vida Animal, destaco que “Shaienny”, encontrada nas ruas neste mês de maio, já se tornou protagonista de seu destino e também de minha história. Totalmente empossada de seus direitos e dona da casa [ou melhor, apertamento] desenvolve-se de forma saudável, premissa básica dos direitos universais de qualquer criança. Vale a dica!


quarta-feira, 23 de maio de 2012

EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO ANIBAL BRUNO



QUANDO OS THUNDERCATS SAEM DA TELEVISÃO PARA INVADIR NOSSAS CASAS.

Na minha juventude “Thundercats” era sinônimo de diversão e alegria; Estado era a expressão máxima da autoridade e poder; e, criança representava a inocência. Estas eram proclamadas como “futuro do Brasil”. Hoje, Thundercats se tornou a representação do medo e da contravenção, revelando o despreparo das instâncias governamentais no combate a violência. Dentro desse contexto, as crianças e adolescentes se tornaram alvos fáceis das redes de exploração sexual. Contraditoriamente, no último dia 18 de maio, que marca o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, foi divulgado pela imprensa um antigo esquema de aliciamento de garotas, comandado pelo grupo de extermínio que há muito atormenta a vida das pessoas e famílias residentes no bairro de Jardim São Paulo. A operação criminosa compreendia no recrutamento e envio de adolescentes ao Complexo Prisional Professor Aníbal Bruno, onde manteriam relações sexuais com os detentos pelo valor de R$ 30,00. Segundo reportagem do Diário de Pernambuco [DP, 19.05.2012], apesar das constantes denuncias a assessoria da Secretaria Executiva de Ressocialização – SERES - do Governo do Estado, informou que seu “serviço de inteligência ainda não tinha conhecimento do esquema supostamente liderado pelo grupo”.

O fenômeno da exploração sexual de crianças e adolescentes é talvez um dos mais bárbaros crimes cometidos contra a humanidade. Não é fato novo, que no ranking nacional, o estado de Pernambuco apareça em lugar de destaque devido aos elevados índices de denuncias e registros desta modalidade de violência. Em todas as suas facetas, seja a prostituição, a pornografia, o turismo sexual ou o tráfico de seres humanos para fins de prostituição, milhares de crianças pernambucanas, incluindo meninas e meninos, são cotidianamente vitimadas pelas poderosas e complexas redes de exploração sexual, nacionais, e até internacionais. Não se pode negar o empenho e contribuições das instituições, sejam públicas, privadas ou da sociedade civil organizada, no enfrentamento ao fenômeno, contudo, sabe-se que muito ainda há por se fazer no sentido de se garantir os direitos constitucionais de nossas crianças e adolescentes. Uma coisa não se pode negar: a violência chega e se instala, onde o Estado se omite, ou não se faz presente. Há muito se sabe que as redes de exploração sexual, assim como as redes que comandam o tráfico de drogas, tendem a se instalar e a se consolidar enquanto “estado paralelo” em comunidades de baixa renda, estabelecendo leis e diretrizes próprias. Grandes comunidades nas mãos de bandidos e contraventores. É neste cenário que o Estado, a quem cabe e compete à garantia das condições mínimas de proteção a vida e a dignidade, torna-se também alvo da contravenção, revelando-se, inclusive, como violador de direitos.

Dizer não conhecer as ações dos grupos de extermínio em nossa cidade é querer tapar o sol com peneira. É brincar de faz de conta. E brincar é uma coisa que as crianças e adolescentes vítimas dos thundercats da vida não fazem mais. Segundo os órgãos competentes as denuncias serão apuradas e os culpados responsabilizados e devidamente penalizados. Será? Assim como será também que a adoção de novas carteiras de identificação, coloridas, por grupos e categorias de visitantes, impedirão a atuação dos aliciadores no presídio? Será que os famosos “gatinhos animados” não se apossarão destas carteiras, e as utilizarão para viabilizar seus crimes? Bom, agora é esperar o próximo 18 de maio para ver. Até porque, em nossa realidade, parece que a exploração sexual de criança e de adolescente tornou-se temática e data institucionalizada de nosso calendário. E assim como o Carnaval, São João e o Natal, só cabem em datas específicas. Até lá é melhor ensinar aos nossos filhos que “quando os gatos saem às ruas, os ratos fazem a festa”. Ou seria mais adequado o trocadilho, “quando os gatos saem às ruas é melhor se esconder como ratos”? Porque é nisso que os thundercats têm transformado nossas crianças e adolescentes. Que saudade do papa-figo da minha época, que atuava sozinho, e por isso, oferecia menos riscos. "Acho que eu vi um gatinho!"

quinta-feira, 17 de maio de 2012

TRANSGENITALIZAÇÃO - A BUSCA POR SI MESMO



No último 04 de maio, o Jornal Diário de Pernambuco, publicou no Caderno Vida Urbana, a reportagem intitulada: Cirurgias de Mudança de Sexo Interrompidas. Nesta, a jornalista Marcionila Teixeira destaca a aposentadoria do Doutor e Professor João Sabino Pinho Neto, responsável pela equipe médica que realizou 22 cirurgias de transgenitalização pelo Hospital das Clínicas - HC, ligado a Universidade Federal de Pernambuco. Além da importância por contribuir para maior visibilidade da temática, a reportagem cumpre seu papel ao anunciar que o médico, único profissional no Norte-Nordeste a realizar cirurgias de Redefinição Sexual, não tem substitutos. Segundo a jornalista, “desde sua aposentadoria, o serviço está parado”, contudo, destaca existir negociações em andamento para que as cirurgias sejam custeadas pelo Sistema Único de Saúde – SUS.

A discussão relativa à cirurgia de transgenitalização ou de redefinição sexual é polêmica e divide opiniões. Conhecida popularmente como cirurgia da mudança de sexo, também é, muitas vezes, anunciada como cirurgia reparativa, ou ainda como cirurgia corretiva, o que parece contribuir para a patologização da transexualidade. Neste sentido, nos cabe a reflexão sobre o fato de tais terminologias conceituais carregarem em seu bojo o reflexo de uma cultura pautada na heteronormatividade. Se considerarmos que a sexualidade ainda plana como tema tabu para nossa sociedade, facilmente entenderemos certas dificuldades, e logicamente, resistências, no sentido de entender a orientação sexual como pertence ao campo da subjetividade, contrário aos papeis sexuais, construídos pela, e na, cultura. O que pretendo dizer é que ser masculino e feminino é uma produção cultural. Aprendemos com o passar dos tempos a nos comportar e entender como homens ou mulheres porque nos guiamos, ainda, pelo recorte biologista do sexo, que estabelece o padrão corporal pênis/homem, vagina/mulher. Se entendermos que masculinidades e feminilidades mostram-se variadas e flexíveis, constataremos que tal padrão torna-se insuficiente para compreender a amplitude das sexualidades. Assim, será que um homem que tem o pênis amputado, seja por alguma enfermidade ou acidente, por exemplo, deixará de ser visto, aceito e reconhecido como tal? Na mesma linha, uma mulher que retirou o útero deixará de se entender como mulher? O que realmente estabelece, contribui ou influencia a formação da identidade sexual, a biologia dos corpos, ou a subjetividade das emoções?

No meu entendimento a identidade se constitui a partir do que uma pessoa se reconhece; ou seja, somos o que acreditamos ser. A sexualidade é um processo de descobertas e não só de construções, logo, não pode ser entendida como opção. Se o fosse, muito provavelmente milhares de homossexuais, bissexuais, transexuais e travestis escolheriam o enquadramento limitante da norma social, e também jurídica, como forma de proteção e preservação de suas, integridades, seja física e/ou mental, diante de uma sociedade homofóbica e machista como a nossa. A patologização não é reflexo ou resultado das sexualidades estigmatizadas como “desviantes”, mas, fruto da cultura anatomo-fisiológica empregada na definição dos corpos considerados “saudáveis”. Ainda no caminho da fácil reflexão, podemos pensar no quanto de imperfeição corporal possuímos todos nós seres humanos, sejam héteros, homo ou bissexuais. Não se nega que as intervenções cirúrgicas tornam-se benéficas para a restauração e/ou fortalecimento da auto-estima. A cirurgia plástica também foi vítima de preconceitos e hoje o Brasil figura como país com maior índice desta modalidade, inclusive para fins estéticos. Quantos membros são transplantados nos dias atuais sem causar grandes celeumas? A medicina avança em benefício da humanidade, e é neste sentido que cumpre com seu papel e fundamento. Muitas vezes, nos olhamos no espelho e não gostamos do que vemos em nossa frente. Um sinal no rosto, uma cicatriz, um cabelo branco, uma sarda, uma ruga fora de lugar e tantos outros pequenos detalhes que nos trazem, muitas vezes, inseguranças, medos, receios, angustias e até sofrimentos. Para estes, a plástica, o botox, maquiagem, tinturas capilares e tantos outros recursos, sejam cirúrgicos ou não, nos servem como refúgios para a minimização ou neutralização das imperfeições. Já vi gente reclamando do formato do nariz, da textura do cabelo, da cor dos olhos, do formato da boca, do tamanho dos seios e nádegas. Já vi gente se martirizar por defeitos físicos possíveis de correção. Lidamos com tais sentimentos no cotidiano, e, também cotidianamente, recomendamos a busca por especialistas. Agora imagina se olhar no espelho e não se reconhecer. Imagina ser cobrados pela família, grupos de amigos, e pela sociedade como todo, a ser o que não se é em essência, ou a se comportar e a se entender por um modelo pelo qual não nos reconhecemos.

Infelizmente é pelo caminho da patologização que os/as transexuais ainda precisam trilhar para realizar o que o médico especialista classificaria como “a cirurgia da busca por si mesmo”. Não podemos ser simplistas ou reducionistas ao pensar que o que se busca através da cirurgia de transgenitalização é apenas um pênis [para os trans-homens] ou uma vagina [para as trans-mulheres]. É mais que isso. Busca-se por uma adequação corporal a identidade. E neste sentido, deve-se esclarecer que o contrário não se aplica, pois que a prática tem revelado a “construção” de transtornos. Se o corpo é passível de mudanças, de ajustes e redesenhos, objetivando a elevação e/ou fortalecimento da auto-estima, que se possibilite o acesso a todos como forma de garantia de direitos. Um pênis e/ou uma vagina são apenas órgãos, como qualquer outro, com funções e configurações específicas. Neste sentido, entende-se que não é a mudança ou transformação do corpo que incomoda, mas, a quebra da norma. E isso se classifica como preconceito, que se pauta em preceitos pré-estabelecidos muito antes de nossa existência, pois que somos contemporâneos.

Aproveito então, para destacar que apesar da importância da reportagem, é preciso atentar para o quanto nos mantemos presos na cultura limitante da heteronormatividade. Digo isso porque conceitos como “homossexaulismo”, “intersexualismo”, “transexualismo” e “travestismo”, usados na reportagem só contribuem para reforçar uma visão patologizante das sexualidades. Considerar a transexualidade como “transtorno mental” é contribuir para a consolidação da homofobia. É neste aspecto que sugiro uma reflexão quanto à utilização de termos como cirurgias corretivas ou reparativas, pois o que se busca na transgenitalização não é a correção ou reparação de algo errado, herdado pela natureza, mas apenas a adequação de uma forma corporal a própria identidade, que é individual e não generalizante ou generalizável.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

RECIFE SITIADA



UMA GESTÃO HIGIENISTA

Há mais ou menos um mês a Praça Maciel Pinheiro foi reaberta ao público sem grandes mudanças. Depredada e esquecida, por muito tempo serviu de refúgio a várias famílias e pessoas em situação de rua. Praticamente funcionava como uma espécie de abrigo a céu aberto onde, homens, mulheres, adolescentes e crianças passavam dias e noites. Colchões velhos cobertos por lençóis furados davam um colorido nada natural ao local. Crianças brincavam nas águas escuras do histórico chafariz, onde também se banhavam, e muitas vezes, mulheres lavavam restos de roupas. Uma cena dantesca para a maioria dos moradores e lojistas da região. Um exemplo vivo do despreparo e descompromisso público bem no centro da cidade. A praça em si parecia uma miniatura da “cracolândia” paulista, fazendo-se necessária intervenção urgente. Primeiro, a fim de garantir atendimento médico e social aos usuários que mais pareciam mortos vivos; e, segundo, visando restaurar o patrimônio público amplamente prejudicado pela poluição e sujeira que lhes causavam um aspecto escabroso.

Assim, a praça passou uns quinze dias, completa e misteriosamente isolada por tapumes de madeiras. Os operários demonstravam pressa e pareciam correr de um lado para outro com suas ferramentas. A população em situação de rua deslocou-se para as redondezas. E neste caso específico, as redondezas diziam respeito às sobras das calçadas onde foram armados os colchões e varais de sobras encardidamente coloridas. Terminados os serviços reparatórios, mas não restauradores, a praça foi reaberta. As esculturas foram aspiradas, voltando a revelar a brancura marmórea original. Os supostos jardins foram limpos, mas não arrumados. Até deram uma mão de tinta, ou verniz, na escultura da Clarice Lispector, que agora não possui mais abajur. Os bancos foram pintados e o chafariz foi desligado. Por isso os leões não cospem mais águas aveludadas. Por isso não existe mais lodo para as crianças se banharem. Por isso também, não existe mais espaço para se lavar velhos trapos que um dia foram considerados roupas. Não foi bem um trabalho de restauração, mas talvez uma ação de higienização, dessas promovidas de improviso e de forma incosequente como tanto se vê por aí a fora.


Talvez tenha sido a maneira mais prática e rápida que encontraram para limpar os restos e tralhas humanas que insistiam em parasitar sobre as históricas pedras claras. Acho que realmente estavam com muita pressa em resolver o velho problema, tantas vezes denunciado em jornais e blogs. A final de contas atender com prontidão as solicitações dos eleitores é obrigação de qualquer político sério. Principalmente quando se busca a reeleição. Porém, atender aos pedidos da população nunca foi coisa fácil. Como já diz o ditado popular, “não se consegue agradar a gregos e a troianos”. Ou bem uma coisa, ou bem outra. As duas, de uma só vez, impossível até ao mais esperto e astuto estrategista. Se existem divergências entre os interesses populares, opta-se sempre pela maioria. E assim se fez. E se a população em situação de rua, minoria, não saia por bem, teve mesmo que sair por mal. Mas ninguém pode negar que a gestão publica realizou intervenções no local. Não, isso não se pode negar. Eu mesmo vi profissionais da assistência social fazendo as famosas “abordagens de rua”. Tinha até veículo da prefeitura disponível, caso alguém desejasse ser removido, ou institucionalizado. Mas infelizmente população em situação de rua não é um segmento fácil de trabalhar. Não, não é mesmo. É preciso tempo, e logicamente, argumentações concretas e focadas nas necessidades e possibilidades individuais. E isso não se consegue da noite para o dia. O que se consegue nesse período de tempo, chama-se evacuação de área.


Como diz outro velho ditado, “não se pode cobrir um santo e descobrir outro”. Isso não é justiça social. Não é garantia de direitos. Higienização nunca foi à melhor solução. É preciso planejamento para efetivar as políticas públicas. E vale salientar que neste caso, a institucionalização compulsória não se aplica. Tem que se trabalhar na raiz do problema, porque simplesmente podar a copa, muitas vezes, só contribui para entortar ou atrofiar o caule. E nesse trocadilho todo, também não adianta justificar as falhas alegando que “pau que nasce torto, morre torto”. Apenas internar usuários de drogas em unidades de saúde para desintoxicação, sem garantir reinserção familiar e inserção no mundo do trabalho, é brincar de enxugar gelo. Sitiar uma praça pública para impedir a fixação de maltrapilhos desassistidos é transferir o problema. Até porque se a Praça Maciel Pinheiro está livre da população em situação de rua, a frente da Igreja da Imperatriz e o corredor comercial da Rua do Hospício, em frente ao Teatro do Parque, estão repletos. É que com a instalação de viaturas da polícia e alocação de guardas municipais, responsáveis pela proteção do patrimônio cultural e histórico, os antigos “moradores” foram obrigados a procurar novos abrigos em calçadas e becos, tão sujos e desprotegidos como outrora fora a praça.

Assim, perde todo mundo. A praça continua feia e sem atrativos dignos de uma sesta ou descanso ocasional por parte dos trabalhadores e transeuntes. A bela escultura, onde uma índia se banhava, ficou estática e sem vida depois que fecharam a água. Com certeza seu antigo aspecto e funcionalidade de bica eram mais respeitosos. Afinal de contas, “a praça é do povo, assim como o céu é do condor”. Resumindo a ópera, enquanto não se efetiva as políticas publicas de forma eficiente e eficaz, melhor deixar as praças e os céus aos “com-dor” e aos “sem-dor”, pois que se torna mais democrático. Já que nem esta, a democracia, tem garantido a efetivação da igualdade e a garantia de direitos que viabilizem a dignidade. E que esta, por fim, a dignidade, fique a cargo dos gestores públicos e políticos no desenvolvimento de suas atribuições. Talvez seja melhor, e mais rápido, realizar novo concurso público para aumentar o efetivo da polícia e garantir que todas as praças da cidade sejam sitiadas. Só não sei se dá para fazer isso tudo antes das eleições. Será que conseguem? Melhor, ver pra crer. A pena é ter que esperar para votar.


domingo, 13 de maio de 2012

DIFERENTES TEMPOS PARA DIFERENTES PESSOAS


 
Seu nome é Raul, mas poderia ser Pedro, Paulo, José, Marcos, Bruno, Henrique ou qualquer outro em iguais condições. Mal completara sete anos, mas poderia ter muito menos ou pouco mais, pois que o fato não mudaria sua sina. Sua voz transmitia a inocência, que como tantas se perderam e se perderão no tempo. Porque o tempo é urgente para quem se encontra na miséria. É fundamental para quem tem fome. Acima de tudo, é cruel para quem busca alternativas viáveis a transformação social de tantas crianças marcadas pelas desigualdades socioeconômicas e políticas. O tempo se perde no vento, assim como as vidas dos que não vislumbram perspectivas. Perde-se no espaço, que delimita e demarca destinos. O tempo mata! Quando não a vida, os sonhos, sem os quais não se vive. Esgota e se esgota em diferentes expectativas para sufocar a todos. Tanto aos que perdem a esperança, como também aos que nela se afundam. Assim, o tempo transforma-se em um implacável limite demarcador entre o fracasso e o sucesso.

Raul me disse que estudava quando tinha aula, o que nem sempre acontece. Também disse que gostava de matemática, e por isso vez cálculos, contando nos dedos das mãos e dos pés. Os dedos que se encontram feridos e calejados pelo trabalho forçado. Contou-me ainda que “limpava matos” com o pai, motivo pelo qual sem sempre podia comparecer as atividades desenvolvidas pelo projeto em que atuamos. Do seu jeito, revelou que não tinha tempo para ser criança. E nós não tivemos, ainda, o tempo suficiente para convencê-lo do contrário. Assim como não encontramos possibilidades, ainda, de convencer a sociedade do contrário. A violação de direitos tornou-se naturalizada para sua família. Sua irmã mais velha já cuida da casa sozinha. Ela lava roupa, cozinha, arruma e ainda arranja tempo para estudar, quando tem aula. Também “cuida” da irmã caçula e de um bebê da vizinha. É praticamente a dona da casa, me dizia ele, que não se esqueceu de mencionar que a mesma tem apenas nove anos.

Crianças como Raul, suas irmãs e mais uma enorme quantidade que vive as margens da sociedade parecem não lutar contra o tempo, mas contra as diversidades. Lidam com a violência cotidianamente, sem mesmo compreendê-la. Nem mesmo a percebem como tal, pois que esta se tornou referencial na construção de suas vidas e personalidades. Não reclamam da “lida”, mas apenas da falta de tempo para brincar junto com os demais. É neste ponto que o fracasso se faz angustiante. Como na velha história do boiadeiro, sacrifica-se um boi para salvar a manada. Quem atua no terceiro setor sabe do, e vivencia o, limite de abrangência de suas ações e atuações. Assim, focamos em restritos grupos ou segmentos da população, mesmo sabendo da sua mínima representatividade percentual no universo das vulnerabilidades. Recursos financeiros limitam pés e mãos. Transformam-nos em polvos amputados, incapazes de estender seus tentáculos aos excluídos. Trabalha-se numa perspectiva do que talvez pudéssemos chamar de “sorte social”. É sempre preciso “escolher” um pequeno grupo, um mínimo, para atender em um determinado tempo, e partir daí buscar e/ou favorecer a transformação social.

E é este mesmo tempo nos fragiliza ao revelar no final que precisamos nos contentar, e nos felicitar por tais empreitadas, muitas vezes, consideradas bem sucedidas. E quando olhamos o quanto deixamos de atender, ou ainda analisamos o quanto poderíamos ter ampliado nossas atuações em detrimento da demanda, os resultados obtidos mostram-se ínfimos e frustrantes. Conversas como a que tive com Raul se configuram como socos em nosso estômago. É como se dissessem “Olha, vocês não são competentes. Eu estou aqui e vocês não me viram. Vocês também me excluíram”. Olha-se para dentro e percebe-se a insuficiência do tempo. O mesmo tempo que mede e classifica nossa habilidade e capacidade profissional. O mesmo tempo que se configura em diferentes formas de velocidade para diferentes pessoas. Insuficiente para as crianças atendidas; mínimo para os operadores da ação; e, muitas vezes, demasiadamente longo e oneroso para os patrocinadores. Quem atua, ou pretende atuar na área social deve saber que sempre será necessário mais tempo. Para buscar novos financiadores, para convencer pessoas-chaves, para articular políticas, escrever projetos, definir metodologias, e mais uma vez, escolher os novos sorteados sociais. Será preciso esperar e respeitar a burocracia, assim como as hierarquias do poder, que estabelecem seus próprios tempos. Acima de tudo, se fará necessário respeitar nosso próprio tempo. Como uma espécie de alienação momentânea para poder voltar a respirar, refletir sobre a importância de suas ações e ideologias. É o “parar” para não parar. Não desistir. Não se perder.

A cada projeto “finalizado”, e digo isso considerando o tempo previsto, que logicamente se correlaciona aos recursos financeiros propostos, chega um tempo que é mágico. O tempo de chorar. E digo de cátedra que o choro é minha forma de [re]energização. Chorar pelo sucesso. Chorar pelo fracasso da impossibilidade. Chorar por relembrar todo o processo e a evolução humana estampada nos rostos risonhos de crianças antes invisibilizadas e destituídas de tudo. Chorar por ter que entregar seus destinos de volta. Chorar por saber que cada criança daquela se tornará inesquecível. Chorar pela incompreensão humana, pela insensibilidade alheia. E principalmente por você. Por acreditar nesta loucura que se chama garantia de direitos. É isso! Acho que mais uma vez chegou minha hora mágica. O tempo de minha fragilidade. O tempo de me agachar no piso do banheiro e abrir a água para lavar meu pranto. Tempo de purificar a minha alma despejando no ralo qualquer sinal de cansaço. É o tempo necessário para recobrar minha confiança, fundamental para os novos desafios, mesmo sabendo que o meu tempo será sempre diferente dos tantos e quantos Rauls que encontrarei pela frente.

domingo, 6 de maio de 2012

MAIS UMA REFLEXÃO SOBRE A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

DUAS VIDAS, DOIS DESTINOS.

Duas situações vivenciadas nesta semana me trazem de volta à temática: “população em situação de rua”.

Quarta-feira, dia 03 de maio. Na Av. Conde da Boa Vista o vai e vem de pessoas apressadas revelava o cotidiano de uma cidade isenta de culpas. Em um poste, diante de meu prédio, uma criança dormia sobre uma caixa de madeira tão frágil quanto sua própria vida. Eram dez horas da manhã e a cidade se revelava impune. Pessoas trombavam na cama improvisada. Algumas por acaso; outras, em propositados e desconcertantes desagravos. O corpo balançava no ritmo de músicas brega que invadem o ar cotidianamente. A inércia de um sono quase morte invalidava a defesa. Existia o risco de cair para além do meio fio. De se transformar em um pacote de carne e ossos atropelado por um ônibus qualquer. As pessoas se limitavam a observar a cena e a demonstrar reações, das mais diferentes formas. De repente o céu escureceu. Uma chuva grossa e pesada caiu sobre o corpo que demorou a recobrar a consciência. A natureza tomou as rédeas das providencias imediatistas e injustas, expulsando o garoto negro de seu berço débil.


Quinta-feira, 04 de maio. Na Av. Manoel Borba o vai e vem de pessoas apressadas revelava o cotidiano de uma cidade imune as suas mazelas. Um miado me chamou a atenção. Uma pequena gata chorava o abandono ao lado de um jovem adulto que há anos reside nas calçadas do quarteirão. “Acabaram de jogar ela aí”, disse ele de forma comovida. Desisti de meu destino e voltei com o pequeno animal para casa. Contudo, no caminho, me peguei pensando sobre o outro abandonado. Há quanto tempo o teriam jogado ali? Na verdade, a reflexão exige amplitude de análise e talvez por isso se torne incomoda, pois se refere não ao tempo, mas ao sujeito da ação. Ou seja, quem o teria jogado nas ruas sujas do Recife? A mãe, a família ou estado? Se pensarmos que o estado é apenas uma instituição, fruto da criação humana, para nos representar enquanto cidadãos de direitos, concluiremos que somos nós que jogamos diariamente milhões de pessoas as margens de uma sociedade inconsequente.


São duas vidas e dois destinos: um bicho gato e um bicho homem. Duas crianças rejeitadas pela sociedade, a espera de uma chance de vida. Ou melhor, são milhares de vidas sem destinos certos. Continuamos uma cidade de abandonados. São homens, mulheres, pessoas idosas e várias crianças e adolescentes sem condições dignas. Misturados a animais rabugentos e também indefesos. Um gato jogado no ralo se leva para casa, mas uma criança condenada aos esgotos, para onde levá-la? A quem se recorre? Que providencias efetivas se toma? Para que berço se transfere um menino sozinho acalentado pelas drogas? Hoje minha gata tem nome, tem lar, comida e local adequado para dormir. Os meninos da minha rua continuam soltos no mundo. Em três dias o pequeno animal se adaptou a nova realidade e ambiente. Corre segura de um lado para o outro do pequeno apartamento, enquanto que os meninos correm de uma rua para outra sem paradeiros. Meu animal tornou-se mais cidadão do que milhares de pessoas humanas que continuam invisíveis e invisibilizadas pela falta de políticas públicas eficientes.

Mais uma vez, paro para pensar sobre que invisibilidade realmente falamos nestes casos. Da que se torna característica de alguns segmentos da população desassistida; ou da que adotamos como mecanismo de defesa, para justificar nossas faltas? O misto de impotência e revolta que me invade sempre nas mesmas situações provocam reflexões sobre as reais possibilidades de mudanças tão desejadas. Quando adotaremos a máxima de que “Um país justo, é um país sem misérias”? Neste sentido busco amparo no desabafo de uma grande amiga, militante dos direitos humanos, que ao ler meu relato sobre a vulnerabilidade das famílias fixadas na Praça Maciel Pinheiro [ver: Meninas que passam e morrem nas ruas do Recife] reflete meus próprios sentimentos e incertezas:


“É foda! Desculpe a expressão, mas seu manifesto está me doendo na alma e foi meu café da manhã no trabalho. Estou com um sentimento que não sei descrever, a dor da alma é tão intensa que meu corpo dói. Pelo menos hoje, a imagem dessa menina não me sairá da mente e sei, voltará diversas vezes a me atormentar, a me envergonhar por me sentir fazendo parte de quem apenas chora a dor do outro... Vasculho a mente e me pergunto o que realmente posso fazer? Será que sairei dessa realidade sem poder andar em calçadas dignas, vendo pessoas com seus direitos garantidos, podendo olhar no meus olhos em vez de baixar a cabeça e me pedir centavos? Ou me atacar, motivada pelas diversas formas de fome? Será que ainda irei andar pelas ruas de Recife sem sobressaltos....? Sem sentimentos mistos de medo, tristeza e revolta pelo que está posto? E finalmente, será que realmente labuto em prol dessas pessoas ou apenas para garantir meu pão? Enfim, amigo, te agradeço "essa mexida" pois precisamos sair da inércia, chorar apenas não transformará o mundo e tenho consciência que muito precisamos fazer e vou nesse momento dar minha contribuição divulgando esse texto, não só na rede social, mas impresso para pessoas que podem acordar e se indignarem. Talvez assim, formemos um batalhão na busca de viés de mudanças reais e não as que executamos e que cobrem desejos, vaidades e satisfações pessoais de alguns”.

No mesmo sentido, relembro ainda do depoimento de outra grande profissional da assistência social, há quem muito admiro pelas convicções e coerências de ações, que dizia: “Não acredito em quem não gosta de animais”. Em consonância digo mais: não acredito em gestores que não gostam de pessoas, pois que as destituem de suas condições de humanos para rebaixá-las a de animais. E Recife é uma cidade que não cuida de seus animais, sejam estes naturais ou humanos.