sábado, 4 de fevereiro de 2012

VIAGEM AO VELHO MUNDO EM 20 DIAS - Capítulo XII

LISBOA - PORTUGAL

LISBOA: A CIDADE DO FADO

Diz à história que do cais de Belém, pelo Rio Tejo, no ano de 1500, saíram às naus portuguesas rumo às índias. Mas quis o destino, ou os interesses políticos e econômicos, que uma grande tempestade trouxesse a companhia de Cabral às terras brasileiras. E assim nos tornamos colonizados. Hoje a mesma viagem que durou meses em meio a tempestades e tormentas se faz em oito horas de vôo, não menos turbulentas. Chegar a Lisboa é quase retornar-se a casa. O filho pródigo volta ao lar. Ou como diria Buda, o rio sempre retorna por onde outrora passou [citação em Sidarta, de Hermann Hess]. E tudo funciona como uma espécie de retorno às origens. A fora a língua, a culinária, os modos, a arquitetura e a cultura nos são muito próximas. Pela Avenida República chegamos ao hotel, Albergue da Juventude, localizado no centro, próximo a Praça Marques do Pombal. Nela, uma grande estátua se eleva para homenagear o homem que reconstruiu a cidade depois do grande terremoto acompanhado de tsunami que a assolou e a reduziu a ruínas.


RIO TEJO
A Avenida da República é ampla e corta a cidade, divida em bairros tradicionais e históricos. Por ela chega-se ao Campo Pequeno, onde uma grande arena serve de espaço as touradas. O cantor brasileiro lançado ao estrelato internacional tem show marcado para fevereiro. Pena que a nossa primeira referência a invasão inversa, onde os brasileiros marcam presença nas terras dos lisboetas seja de tão discutível qualidade. Adiante se encontra a Praça Duque de Saldanha, de onde a avenida recebe o nome de Fontes Ferreira de Melo, para depois da Praça Marquês do Pombal se transformar em Avenida Álvares Cabral. A partir da Basílica da Estrela, localizada diante de um grande e harmonioso parque, esta será mais uma vez renomeada para se transformar em Avenida Infante Santo e desembocar na Doca de Alcântara, onde forma uma espécie de anel. Ao sul, a mesma via passa a ser conhecida como Avenida da Índia e nos leva ao centro cultural de Belém, onde hoje se encontra instalado o Padrão dos Descobrimentos. O monumento é belo e imponente, representando uma grande caravela que ruma em direção ao oceano. Pela orla alcançamos a Doca do Bom Sucesso. Atravessa-se uma ponte em madeira e entra-se na Torre de Belém, antigo castelo que se mostra rodeado pelas águas do Rio Tejo. No centro cultural oito museus contam e recontam as histórias e tradições de Portugal. Próximo ao Lago das Princesas está o Museu Berardo, acompanhado do Museu de Arte Popular, o Planetário e o Museu Nacional de Arqueologia. Na Praça de Málaca encontra-se o Museu da Marinha que resgata as grandes conquistas portuguesas, próximo ao Mosteiro dos Jerônimos que se estende soberano e revela a arquitetura clássica portuguesa. A poucos metros encontramos o Museu da Presidência da República e adiante o Museu Nacional dos Colches. Neste, a riqueza de detalhes se revela nas antigas carruagens utilizadas pela família real. Estão ali algumas carruagens presentaeadas aos papas e reis da Espanha, Inglaterra e França. Fecha-se o ciclo cultural [ou quase círculo] com o Museu da Eletricidade.


PADRÃO DOS DESCOBRIMENTOS
Voltando em sentido norte, pela mesma Avenida da Índia, chega-se ao Museu do Oriente, onde a via transforma-se em Avenida 24 de Julho, que nos leva ao Museu de Arte Antiga e depois ao Cais do Sodré. Alguns metros a mais e entramos na Praça do Comercio, de onde se pode avistar o antigo Castelo de São Jorge e a Igreja da Sé de Lisboa, no ponto mais alto da cidade. A crise econômica enfrentada pela Europa se faz mais presente e evidente em Portugal. É claro que na Itália e na frança se fala da crise econômica e se teme o futuro. Destacam a situação privilegiada do Brasil como futura grande potência e revelam certo ressentimento, até, pelas novas perspectivas. Na verdade verifica-se claramente o quanto a crise e o novo cenário atual tem atingido o orgulho e auto-estima européia. Neste ponto, Londres se mantém distante, mas não imune ao efeito cascata. Fora da União Européia, adota moeda própria e talvez por isso sofra menos os impactos. Mas em Lisboa a crise é claramente evidenciada pelos registros da cidade. A população em situação de rua revela uma realidade também muito próxima a nossa, considerando as proporções, claro. Na Praça do Comércio, por exemplo, moribundos, desempregados e idosos oferecem “marijuana” [maconha] a céu aberto. Também nos ofereceram cocaína. A situação, de certo modo, chega a ser acintosa, pois não se espera ver na Europa as mazelas dos países subdesenvolvidos. Mas em suas devidas proporções estão lá.

No sítio histórico, próximo ao Teatro Nacional D. Maria II, localizado diante de uma grande praça, homens desocupados, em sua maioria, negros, se amontoam em bancos e esquinas. A polícia municipal [ou estadual] se faz presente. Contudo, algo de estranho torna o ar tenso a um visitante mais atencioso. Seguimos nosso passeio e nos deparamos com a Casa dos Bicos, velha construção de paredes pontiagudas. Mais adiante se encontra o Museu do Fado e as Portas do Sol. No dia seguinte vamos até o Castelo de São Jorge. A subida a grande colina é feita de bonde e torna-se uma experiência única. As ruas estreitas revelam conjunto arquitetônico riquíssimo em detalhes que salientam o cotidiano das velhas vilas portuguesas. Apesar dos problemas sociais a cidade é extremamente limpa, bonita e organizada. Velhos casarios se estendem pelas vias de acesso, de onde se avista varais com roupas de uso que flamulam livre ao sabor dos ventos. Senhoras de cabelos grisalhos conversam das janelas. A cidade está viva e parece seguir sua rotina normal, indiferente a presença de estranhos.

ELEVADOR DE SANTA JUSTA
A TORRE EIFFEL DE LISBOA
 
CASTELO DE SÃO JORGE
Das ruínas do antigo castelo se tem uma visão panorâmica da cidade e entende-se um pouco de sua complexidade. Na verdade lembra as ruas e casarios de Olinda, ou do bairro antigo do Recife. Depois do maremoto que destruiu a cidade, os prédios foram construídos em formato quadrado e com estrutura para suportar novo ataque marítimo. Desta forma, a cidade foi planejada, o que lhe confere um sentido de ordem que se sobrepõe a desordem do momento atual. Um fato que chama a atenção é a quantidade de alunos em visita aos museus, comum na Europa, e erroneamente raríssimo no Brasil. São as aulas de história e arte que acontecem diariamente, contribuindo para a consolidação do orgulho e cidadania portuguesa, londrina, francesa e italiana. Das antigas muralhas do castelo verifica-se a movimentação da cidade. Na área externa ruas calçadas com paralelepípedos nos levam a antigos e históricos restaurantes. Não se come em Lisboa sem antes experimentar o tradicional pão umedecido no Azeite de Oliva.


TEATRO NACIONAL D. MARIA II
Portugal como os demais países que visitamos vive da cultura. É comum frequentar teatros durante os dias da semana. Seja terça ou quarta feira os espetáculos estão lotados. No Teatro Nacional D. Maria II assitimos “Quem Tem Medo de Virgínia Woolf”, de Edward Albee, encenação com três horas e meia de duração. No Teatro Comuna de Pesquisa, mais três horas para ver “Design For Living”, de Noel Coward. Apesar de longos os espetáculos mostram uma arte consolidada, madura e profissional. Diferentemente do Recife, é possível se viver com dignidade do teatro e das artes de modo geral na Europa. Na televisão a programação é diversificada. As novelas fazem sucesso e revelam a influencia sobre nossa cultura. “Morangos com Açúcar” seguem a formula da Malhação. Perece não existir horário fixo para as novelas, pois que as duas e meia da manhã ainda rende os capítulos de “Meu Anjo”, que entra no ar depois de “Santo Remédio”. No domingo após nossa partida estava prevista a estréia de “Proibido Amor”, cujo slogan alertava que “quanto mais proibido, mais apetecido será o amor” e com elenco formado pelos atores que estão em cartaz no D. Maria II. A quantidade de anúncios de remédios chama a atenção. Para um desavisado a sociedade lisboeta se mostra doente, ou hipocondríaca. Depois refletimos e constatamos que não é tão diferente no Brasil. Não existem propagandas de bebidas alcoólicas ou cigarros. O jornalismo alerta os compatriotas sobre a crise. O governo português reduziu benefícios e cortou 13º, 14º e férias remuneradas também para os empregados da rede privada. Entre as medidas mais drásticas, 15.000 aposentados perderam ou tiveram reduzidos seus benefícios. Os bombeiros entrariam em greve devido ao atraso nos salários e falta de condições de trabalho, inclusive falta de fardamento.

Neste   sentido, a Praça Marquês do Pombal serve de espaço para os movimentos sociais e políticos. Lisboa em comparação com París, Londres ou cidades italianas se mostra mais verdadeira e real, menos cenográfica. O povo vai às ruas para reivindicar direitos. Na conjuntura atual o turismo se mostra uma estratégia de sobrevivência. São amáveis com os brasileiros, latinos de modo geral e principalmente com os orientais. Assim como os brasileiros, os indianos se mostram a vontade e encantados com o velho mundo. Os japoneses, coreanos e todos os de olhos puxados andam pelas ruas em grupo, de mãos dadas, como cordas de caranguejos. Impacientes se mostram mal educados. Furam filas, falam alto e esbravejam a morosidade a que não estão acostumados. Um descuido e pode-se ser atropelado por eles em qualquer lugar das cidades européias. Mas apesar da agitação política e econômica que enfrenta Lisboa se mostra calma e tranquila, tanto que se pode andar de madrugada pelas ruas sem receio ou medo de assaltos. Aparentemente não existe violência urbana, pelo menos nas proporções a que nos acostumamos.

PARQUE EDUARDO VII
Na  verdade    a cidade dorme cedo  e acorda tarde, talvez devido ao inverno, que segundo eles ainda não havia chegado. Estávamos a 12 graus mais conseguíamos sair sem uma grande quantidade de casacos. Próximo a Praça Marquês do Pombal encontra-se o Parque Eduardo VII [descendente do rei gay inglês, Eduardo II, abominado pelo Reino Unido]. Belos jardins se elevam para cima da colina transformando o espaço em uma área exuberantemente verde. Uma ida rápida no banheiro público e mais uma característica nacional nossa se revela. A pegação se mostra persistente e acintosa, tal como no Brasil. Interligado encontra-se o Parque Amália Rodrigues, famosa cantora que desfia lamurias e casos amorosos no melhor estilo melodramático. São os amores proibidos que povoa o imaginário dos fadistas. À noite no Baixo-Chiado, bairro alto e histórico da cidade, é romântica e melancólica ao mesmo tempo. Sentar em um dos bares e apreciar uma boa cerveja, e principalmente o famoso vinho do Porto torna-se uma experiências fenomenológica e inesquecível.
PARQUE AMÁLIA RODRIGUES



A CRISE EUROPÉIA

Depois de uma semana em terra lusitana começa-se a compreender melhor a vida, a cultura e o cotidiano dos portugueses. Impossível se torna não identificar sua influencia sobre a nossa cultura, vida e cotidiano. No aeroporto, a agitação dos brasileiros nos faz começar a despertar para a realidade. É como se começássemos a sair de um sonho bom. Fala-se alto, gesticula-se demais. Existe uma variedade enorme de sotaques que agora nos parecem estranho, porém não menos belos. Nos identificamos de imediato. Nos encontramos ao sorrir com a espontaneidade brasileira. Somos frutos da mistura e por isso nos tornamos misturados dentro de uma mesma nacionalidade. Somos múltiplos, e acima de tudo somos vivos. Não somos mal educados, mas apenas seguimos uma ética de conduta própria e inigualável. Temos o sangue quente como o sol. É isso, somos a terra do sol. E somente isso nos torna Iluminados e únicos.

Próxima parada, carnaval de Recife e Olinda!

A TERRA DAS TOURADAS

FIM DE VIAGEM

Nenhum comentário:

Postar um comentário