quinta-feira, 31 de maio de 2012

AS MULHERES DE MAIO







MULHERES QUE FAZEM A HISTÓRIA



Maio é o mês das noivas, mês das mães, mês da mulher. Quinto mês do calendário gregoriano demarca a chegada da primavera. Maio se escreve com “M” assim como mulher. Neste sentido, torna-se símbolo de luta e batalhas sociais. Desta forma, nada mais oportuno do que terminá-lo destacando algumas mulheres que fizeram, atualizaram, escreveram ou reescreveram a história, pessoal e nacional, durante o maio de 2012.

Depois de mais de quarenta anos, a apresentadora e eterna “Rainha dos Baixinhos”, Maria das Graças Meneghel – a Xuxa - revelou em cadeia nacional uma infância e adolescência marcada por um tipo de violência que a sociedade faz questão de manter em silêncio. Vitima de abuso sexual até os 13 anos, afirmou saber o que uma criança sente quando é violada em sua intimidade e inocência. A notícia reacendeu a discussão e contribuiu para aumentar o número de denuncias sobre um fenômeno que não é apenas nacional, mais mundial, e acomete milhares de crianças, incluindo meninas e meninos, cotidianamente. Também dividiu opiniões da sociedade, que mais uma vez revelou o despreparo no trato da temática. Acusada de oportunismo por alguns, desacreditada por outros, difamada por tantos mais, Xuxa tornou-se mais uma vez vítima da violência. Sites da internet dispararam em reeditar cenas de um antigo filme onde a atriz [e não a pessoa] aparece em cena erótica com um adolescente. As salas de bate-papo abriram debates a respeito da integridade pessoal e conduta moral da apresentadora, mas não discutiram o tema em foco. Jornais e revistas aproveitaram o “furo de imprensa” para ampliar suas vendas. Até parlamentar quer seu depoimento em CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] sobre abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. Se a acusação é de oportunismo, talvez fosse necessária uma maior reflexão sobre quem, neste caso, se configura como real sujeito da ação.

Na verdade, o depoimento de uma das mulheres mais famosas do Brasil, reabre a velha discussão sobre até que ponto a eroticidade e a sexualidade das pessoas, consideradas por alguns preconceituosos e despreparados como “exacerbadas” ou “fora do normal”, tornam-se convites ou espaço de autorizo para a violação. A vítima, neste caso, passa a ser culpabilizada, respondendo pela agressão sofrida. Torna-se a vilã de uma história que não escreveu. Talvez seja a maneira ou forma mais rápida que a sociedade tenha encontrado para purgar suas próprias responsabilidades e negligências. Talvez seja reflexo de nossa cultura machista, onde mulheres e crianças ainda são vistas como não sujeitos de direitos, e por isso, passíveis de subjugação. Mas, talvez, seja apenas resultado do comprometimento de nossa educação de base, que nos impossibilita as análises próprias, e nos torna repetidores de opiniões alheias. Independente disso, Joana Maranhão, atleta pernambucana e vencedora de medalhas, também revisitou sua história em cadeia nacional, nesta última terça-feira, 29 de maio, para ampliar a discussão sobre a necessidade de medidas mais eficazes sobre o enfrentamento ao abuso sexual, e principalmente eficiência no atendimento das vítimas. Entra para a história por ter provocado a alteração da lei que passa a estabelecer que a prescrição do crime passe a contar a partir da maioridade da vítima, e não mais a partir da data do crime. É assim que se contribui para o desenvolvimento de uma sociedade, ainda que seja necessário se expor e reviver os traumas. No mesmo rastro as meninas do bairro de Jardim São Paulo trazem a tona o despreparo das instancias governamentais ao expor o esquema de exploração sexual contra crianças e adolescentes dentro do Complexo Carcerário Aníbal Bruno, comandado pelo grupo de extermínio Thundercats. Será que os responsáveis legais também serão convocados para depor na CPI? Neste caso, melhor deixar como dica!

No mesmo mês, a atriz Carolina Dieckman teve sua intimidade devassada por internautas oportunistas e inescrupulosos. Os sites pipocaram com as fotos íntimas de uma profissional séria e mãe de família. O mais impressionante foi verificar as próprias mulheres, principais vítimas da modalidade de violência sexual, enviar e distribuir as fotos na rede social. Algumas ainda se acharam no direito de fazer avaliações sobre sua performance, acrescentando opiniões do tipo: “esperava mais!”. Talvez a atriz também esperasse, no sentido de cumplicidade e respeito, afinal de contas qualquer um está sujeito a esse tipo de violação. Carolina também entra para a história, não como pornográfica, mas como mulher consciente de seus direitos, revelando para o país que a justiça, apesar de desacreditada, ainda pode funcionar. Neste sentido, acredito ser interessante e necessário destacar aos desavisados que a exposição involuntária do corpo alheio também se configura como crime sexual, e que muitas vezes, a simples curiosidade, e até mesmo nossos mais inconscientes desejos perversos nos alça a condição de infrator e delinquente. Não se combate a pornografia, modalidade da violência sexual, e por conseqüência as redes de exploração sexual, divulgando ou repassando “fotos sexys”, principalmente quando estas são do campo do privado. Vale mais uma dica!

Outra mulher que entra para a história é a piloto de avião Betânia Porto Pinto, que na semana passada foi surpreendida por um passageiro que se negava a seguir viagem pelo simples fato da comandante ser mulher. Abrem-se mais uma vez as discussões relativas à igualdade das capacidades físicas e intelectuais entre homens e mulheres para assumirem determinados postos de trabalho. A situação não é tão diferente quanto à de Dilma Roussef, primeira mulher a assumir a presidência da república em nosso país tupiniquim. Violência não é só a que deixa marcas no corpo. Assédio moral também provoca e deixa sequelas. É preciso entender, que no Brasil a violência assume proporções e formas plurais. Não é possível que uma profissional com mais de 20 anos de carreira e mais de nove mil horas de vôo passe ainda por situações tão constrangedoras. Assim como Dilma enquadrou neste mês os ruralistas e enfrentou os banqueiros na luta pela redução dos juros, a piloto mineira mostrou-se conhecedora de seus direitos e do seu papel de cidadã. Por falar nisso, o certo é “a piloto” ou “pilota”? Será que levaremos tanto tempo para designá-la enquanto mulher quanto estamos levando com o uso do termo “presidenta”? Será que a reflexão serve como dica?

Também nesta semana, a modelo brasileira Lea T, recentemente transgenitalizada, revelou ainda está se adaptando a sua nova condição de mulher. Entra para a história por vencer o preconceito, trazendo à tona a tão discutida e polemizada cirurgia de transgenitalização [ou cirurgia de redefinição sexual] no mesmo mês que o Hospital das Clínicas de Pernambuco anuncia a paralisação das cirurgias no estado devido à falta de especialistas na área. E neste caso, é preciso que se explique que com a aposentadoria do Doutor e Professor João Sabino Pinho Neto, responsável pela equipe médica que realizou 22 cirurgias de transgenitalização nos últimos anos, não se dispõe, no Norte-Nordeste, de profissional que possa assumir o posto. Destaca-se, contudo, a existência de negociações em andamento para que tais cirurgias sejam custeadas pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Agora é esperar [e pressionar] para que o fato não entre para a nossa história como marco do retrocesso.

No cenário da luta pelos direitos humanos, mais uma mulher a entrar para a história [não só da teledramaturgia] será a “meio mocinha-meio vilã”, Suellen, personagem de Ísis Valverde, em Avenida Brasil, novela das oito horas, da Rede Globo. Pela primeira vez a novela brasileira tratará a temática do tráfico de seres humanos para fins de prostituição. É que a personagem tem origem boliviana e está no país de forma ilegal, agenciada por um cafetão. Desta forma, Suellen tem como missão apresentar para o público o sofrimento e os dilemas de uma pessoa vítima das redes do tráfico de seres humanos, que será mantida, inclusive, em cárcere privado. É esperar para ver e acreditar que a temática da violência sexual seja mais adequadamente desenvolvida do que foi em “Passione”.

Por fim, destacando a excelente iniciativa do Governo do Estado de Pernambuco com lançamento do Programa Pacto Pela Vida Animal, destaco que “Shaienny”, encontrada nas ruas neste mês de maio, já se tornou protagonista de seu destino e também de minha história. Totalmente empossada de seus direitos e dona da casa [ou melhor, apertamento] desenvolve-se de forma saudável, premissa básica dos direitos universais de qualquer criança. Vale a dica!


Um comentário:

  1. Oi Epitácio.

    Como sempre uma postagem sobre uma triste realidade do nosso cotidiano. Lembro, com horror, que trabalhava como lavadeira, na casa de minha avó uma senhora que tinha quatro filhas e, em razão de sua baixa escolaridade, passou a lavar roupas nas casas de família, assumindo tal atividade como sua profissão. Essa senhora, um dia apareceu com as quatro filhas para trabalhar, ou melhor, para pedir socorro.
    Na noite anterior descobrira que seu marido, pai biológico das meninas, respectivamente com 16, 14, 12 abusara das três, usando o argumento de que mataria a mãe e todas elas se algo fosse descoberto. Passara a noite acordada vigiando suas filhas. A denúncia foi feita pela mais velha e confirmada pelas outras porque, ele, o pai, teria chamado a mais nova de apenas 10 anos para dormir um sono com ele. Inocentemente Mocinha, como nós a chamávamos, comentou com uma das irmãs. Revoltadas, as que já conheciam o procedimento do pai saíram às escondidas com a pequena e ficaram na casa de uma vizinha até a mãe chegar.
    Sabe o que aconteceu? Ela foi levada ao MP com as filhas, que confirmaram suas história (conjunção carnal). Com o encaminhamento competente foi feito o exame de corpo de delito e oficialmente verificado o abuso contra as três. O Pai foi preso, a mãe passou ser vista por alguns como uma pessoa traída de forma miserável, o pai como um pedófilo empedernido e as crianças, ora como vítima, ora com desconfiança. Setenta e duas horas depois da descoberta , o pai foi morto no presídio e a mãe morreu de infarto fulminante ao receber a notícia. Não havia parentes maternos conhecidos. Os paternos recusaram recebê-las por que “foram a causa da desgraça do ente familiar”. As meninas distribuídas entre quatro famílias, jamais se recuperaram. Muitos que conheciam os fatos torciam os rostos para elas. Tiveram suas inocências roubadas da pior forma possível, as três, uma a uma, quando completavam dez anos. Alguns jamais esqueceram ou perdoaram as garotas.
    Infelizmente histórias como essa acontecem todos os dias.
    Maria de Lourdes

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