sábado, 2 de abril de 2011

UM GESTOR QUE DÁ AS COSTAS PARA SEU POVO


Av. Conde da Boa Vista



ACORDA JOÃO E VEM VER O RECIFE DE FRENTE

Acorda João e vem ver o recife de frente. Tem gente passando fome e necessidade. Tem gente dormindo ao relento. Verdadeiras famílias que fazem das ruas seus espaços de convivência e moradia. Não que as ruas sejam indignas, mas porque nelas habitam os animais! Não que as ruas inviabilizem a vida, mas porque elas estão sujas! Não que as ruas não se mostrem como alternativas, mas porque estão desprotegidas e abandonadas, como as famílias que nelas vivem! Nossas ruas estão desprovidas das condições mínimas para abrigar crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos, João. As ruas comprometem o desenvolvimento saudável, princípio básico dos Direitos Humanos. Corrompem a moral, afetam a auto-estima e destituem o homem do seu lugar de sujeito de direitos. Elas coisificam meninos e meninas, homens e mulheres, velhos e velhas senhoras. Mas talvez você não saiba por que nunca conseguiu ver o Recife de frente.

Ah, João! Não se pode olhar as ruas de costas. Quantas vezes já te alertamos? Elas nos desafiam a todo instante. As ruas escondem segredos e às vezes se fazem misteriosas só para nos intrigar. Também revelam surpresas que podem não nos ser agradáveis. Sim, as ruas são públicas, João. E por isso mesmo és o principal responsável. Se elas estão sujas, a culpa é tua por não gerenciar a cidade de forma adequada. Se elas estão violentas, também é tua a responsabilidade por não investir em prevenção. E não estamos falando no tradicional método do “vigiar e punir”. Mas em estratégias de governo que garantam educação, saúde e moradia digna. Estamos falando de garantias básicas e de igualdade em direitos. Mas você sabe do que estamos falando, não é mesmo? É claro que sabe, ou pelo menos deveria saber. Afinal de contas você nos prometeu em campanha. A questão é saber apenas se você lembra.

Av. Conde da Boa Vista
É preciso mudar a posição, João. Rotacionar o corpo para ficar de frente. É assim que se deve encarar as ruas. Até por que às nossas costas fica o passado. O que já se foi e não vimos ou não demos a devida importância e atenção. As nossas costas, de certa forma, invisibilizam fatos e situações que reencontraremos mais a frente. Nelas ficam nossos erros e equívocos, nossa insensatez e descompromissos. Mas é preciso entender que nossos desvios de conduta, sejam morais, éticos ou políticos só podem ser corrigidos se analisados de frente. Por isso, nunca dê as costas para as ruas João. Pois elas, provavelmente farão o mesmo com você nas próximas eleições.

Av. Conde da Boa Vista

Por tudo que temos te falado, acreditamos que o Recife não precisa de mais um prefeito que dá as costas para as necessidades urgentes e dos emergentes. Porque estamos órfãos e carentes de políticos que atuem nas linhas de frente. Que arregacem as mangas e que justifiquem nossas escolhas. Precisamos de gestores que se façam presente. Que saiam de seus gabinetes e cheguem às ruas onde se encontra seu povo. É verdade João. O povo está nas ruas. Ou melhor, o povo continua nas ruas. O mesmo povo analfabeto funcional que você ajudou a formar e deixou prá trás. O mesmo povo faminto, de quem você retira a comida e a dignidade, permanece esperando que cumpras com tuas obrigações. E para o povo João, promessa é divida. E dívida se paga com ações concretas e eficientes.

Av. Conde da Boa Vista

Não se dá as costas ao povo João! Principalmente quando se vive do voto alheio. E não estamos falando de trocas ou escambos. Mas de justiça e sabedoria popular. E pode até lhe parecer piada de mau gosto João, mas apesar de você negar educação o povo não é burro. Mesmo você negando saúde, o povo sempre vai encontrar força para fazer valer seus direitos e vontades. E mesmo negando assistência o povo manterá a voz firme. Porque aprenderam nas mesmas ruas que você mantém sujas e fétidas, que muitas vezes é no grito que se ganha uma batalha. A luta travada diariamente pelo povo que vive nas [e das] ruas impregnadas de seus dejetos os fez transformar subsistência em sinônimo de sobrevivência. E é essa resistência que sempre vai denunciar os descasos de sua gestão.

Av. Conde da Boa Vista

É preciso acordar cedo para vir às ruas. E olha João, não precisa ser todos os dias não, para não prejudicar seu sagrado sono que se dá em lençóis macios. Basta uma vez ou outra, para poder ver com teus próprios olhos a sujeira que você deixou se espalhar pelos contos e recantos da cidade. É sua a responsabilidade manter as ruas limpas. Só falta você fazer sua parte, porque a nossa já fazemos pagando os altos impostos. Acorda João porque não estamos te pedindo favores, estamos apenas te cobrando às responsabilidades assumidas e inerentes ao cargo que ocupas. Não objetivamos com isso perturbar as noites tranquilas de tua família, mas apenas minimizar os pesadelos cotidianos de quem não tem onde dormir. E isso não é pedir muito porque é tua obrigação. Não estamos te pedindo grandes esforços ou sacrifícios, e muito menos tua piedade. Não, não é nada disso. Reivindicamos apenas que conheças melhor as ruas do Recife. E isso não se faz de costas. Tem que ser de frente. Tem que deixar o estômago embrulhar ao ver crianças dividindo alimentos com animais. Tem que chorar ao ver a dor e a miséria tomar conta de corpos frágeis e indefesos. Perceber a doença comendo a pele e desfigurando gente. Tem que se sensibilizar ao ver pessoas destituídas da condição humana.

Av. Conde da Boa Vista
João, um dia desses tive dificuldades em diferenciar um menino de um animal rabugento. Era uma cena tão grotesca que não consigo esquecer até hoje. Ele não andava mais e se espremia em um canto agarrado a um tubo com cola. E não era noite. Eram exatamente oito horas da manhã. Mas que pena João, acho que você ainda estava no café da manhã com seus filhos e por isso não teve tempo para ver. Pena maior é saber que mesmo que já estivesses a caminho do trabalho também não verias. Porque você não anda por essas ruas. Não, você não anda. E também não sabe do que estmos falando porque no bairro onde você mora não tem população em situação de rua. Lá a policia não deixa, João. Lá tem segurança e por isso as ruas estão sempre limpas e arrumadas de acordo com o que vocês entendem por arrumação e limpeza.

Av. Conde da Boa Vista

Talvez na próxima campanha eleitoral você resolva passar por aqui. Mas também, talvez seja tarde porque não precisaremos mais de você para manter as ruas seguras e tranquilas. E olha João, não estamos falando da adoção de modelos higienistas a que políticos como você está [mal] acostumado, mas das possibilidades e direitos que garantam a dignidade humana. Estamos falando das condições mínimas e necessárias ao desenvolvimento saudável de toda pessoa humana. Não é misturado a cachorros, ratos, baratas e vermes que se desenvolve um cidadão sadio e consciente de seus direitos e deveres. Não é negando o sono seguro que se forma um homem. Não é dando as costas à população em situação de rua que se resolve as injustiças e desigualdades sociais. É preciso compreender João, que não é o povo das ruas que contribui para o aumento da violência que você e os seus tanto temem. É a violência social que contribui diretamente para o aumento significativo deste segmento da população. E isso também é responsabilidade sua.

Av. Conde da Boa Vista
Não é só policiamento e câmeras que garantem segurança João. Até porque esses recursos não servem e nem atendem a população de rua. Além do mais, segurança é um conceito mais amplo que é perpassado pelo sentido de bem estar, saúde, educação de base, alimentação saudável, assistência e moradia digna. Não sei se você estudou, mas segundo a teoria de Maslow, a necessidade de segurança vem depois da satisfação de nossas necessidades básicas. Isso é elementar,meu caro João!Ou seja, é preciso rimeiro saciar a fome e a sede, garantir o sono tranquilo, garantir e exercício da sexualidade. Isso é básico ao pleno desenvolvimento humano. Fortalecer a auto-estima restitui a dignidade das pessoas João.

Resgatar a dignidade do povo das ruas. É isso João. Era sobre isso que queríamos te falar. Mas acima de tudo, te falar também sobre a necessidade urgente do resgate da tua própria dignidade enquanto pessoa e enquanto político que não tem se mostrado sério e responsável. Mas isso é um processo individual. E neste aspecto, acho que não podemos te ajudar muito porque implica em conceitos morais e éticos que são pessoais e se aprende [e se apreende] desde cedo. Pensamos que talvez não tenhas prestado à atenção devida as aulas ética e compromiso social, o que comprometeu tua formação cívica e política. Ou talvez tenhas aprendido desde cedo a dar às costas as coisas [e causas] importantes. De qualquer forma, João, não é de costas que se respeita um povo. Assim esperamos, quem sabe, que na próxima eleição entendas melhor do que estamos falando.



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