quarta-feira, 8 de agosto de 2012

LA PROSTITUICIÓN EN LA ARGENTINA


 
Em toda a história da humanidade o sexo sempre funcionou como moeda de troca e foco de tensão das relações de poder. Dentro desses parâmetros a mulher foi dividida em duas grandes subcategorias antagônicas. De um lado, as mulheres da casa, a quem cabiam a preservação e manutenção da família, da moral e dos bons costumes; do outro, as mulheres da rua, “livres” para exercerem e vivenciarem suas sexualidades. Enquanto uma circulava [e circula] pelo espaço do privado, a outra se destina ao espaço do público. No rastro, uma torna-se privada ao assumir o papel de esposa e mãe, enquanto a outra se torna pública ao assumir o papel de puta. Uma santificada, a outra demonizada. Ambas, contudo, presas de uma norma heterossexista que as mantém a serviço dos homens. O sexo assume então duas dimensões, vinculando-se a procriação e ao prazer. A norma estabelece os locais adequados para suas vivências. O prazer é mundano, terrestre, e por isso não cabe no privado inviolável e imaculável dos lares. A procriação assume ares divinos, e por isso não cabem as mulheres luxuriosas. Neste sentido a prostituição tem se estabelecido como uma das atividades comerciais mais antigas do mundo, estando presente em várias culturas e sociedades.

Em Recife o universo das práticas sexuais comerciais tem revelado, e se revelado em novas configurações, definindo parâmetros de atualização que visam sua manutenção dentro da ordem social vigente. Territórios são estabelecidos, demarcando espaços públicos e privados sem, contudo, retirar da clandestinidade milhares de mulheres, homens e travestis, que encontram na venda dos prazeres e fantasias sexuais os meios que viabilizam não apenas suas subsistências, mais também a realização de seus desejos. Especificamente no universo da prostituição feminina, as estratégias adotadas para o exercício das práticas sexuais comerciais definem os meios e canais variados de divulgação, incluindo catálogos de “modelos” e acompanhantes de luxo, sites especializados na internet, anúncios em jornais e revistas, filmes de conteúdo pornográfico e as tradicionais batalhas nas ruas, entre outros. Diferentemente de Recife, em cidades como Florianópolis, Rio de Janeiro, São Paulo ou Londres tornou-se comum a divulgação de serviços sexuais e contatos telefônicos através de pequenos panfletos afixados em orelhões de telefones públicos, instalados em bairros periféricos ou estações de metrôs e rodoviárias.

Em Buenos Aires a mesma estratégia é aplicada por mulheres que exercem a prostituição, que ao que tudo indica não acontece em espaços públicos, mas exclusivamente em espaços privados. Também diferente de todas as cidades que tenho visitado tal estratégia não se limita a territórios demarcados como de prostituição, mas espalhados por todo o centro urbano, o que parece revelar certa institucionalização da atividade. Buenos Aires é uma metrópole, formada por largas e longas avenidas, entrecortadas por ruas, que interligam pontos e bairros distantes. Apesar da existência de uma Lei proibitiva [que não consegui identificar se é municipal, provincial ou federal], seja nas extensões da Avenida Corrientes, Rivadávia ou Cordoba; ou nas das Calle Paraná, Montivideo, Florida, Viamonte ou Marcelo T. de Avelar, entre tantas outras, é possível encontrar uma grande variedade de pequenos panfletos, coloridos ou acromáticos, recheados de fotos sensuais, onde mulheres seminuas divulgam seus serviços e valores, afixados em postes, placas de sinalização, coletores de lixo, orelhões de telefones públicos e paredes e muros de prédios antigos. Muitos destes são entregues pessoalmente por “cafetões e cafetinas”, bem como pelas próprias prostitutas, durante o dia ou a noite, em vários cantos da cidade. É a panfletagem do sexo comercial que ocorre 24 horas por dia, sete dias na semana.

Em vários panfletos constata-se o caráter privado outorgado a prostituição feminina. Também se verifica certa categorização, onde as garotas de programa parecem classificadas entre “agenciadas” e “autônomas”. Na primeira categoria os panfletos seguem a mesma padronização de cores e formatação gráfica. Na segunda categoria, observa-se certa variação em formas, tamanhos, cores e diagramação. Em sua maioria, principalmente nos da categoria agenciadas, a proibição da atividade torna-se evidenciada pela mensagem: “volante entregado em mano, no arrojar em la via publica – ley 250”. Muitos parecem destinados, principalmente aos turistas, onde poderá se ler: “Hot Girls – 24 h.” Em complemento ler-se: Nuevitas em Tribunales. O número do telefone e nome das ruas aparece abaixo. Em outros da mesma categoria, encontra-se fotos de nu frontal, onde se ler frases como: “Flaquitas y Pulposas”, “Lo Mejor del Centro”, “Nível Ejecutívo” ou “La Dama Del Lago”. Em todos estes o referencial de espaço para as práticas sexuais é salientado como: privado/domicilio – ambiente climatizado. Muitos trazem tarja em destaque, ao lado das modelos, com os valores – “Promo $50”. Estas promoções parecem variar entre cinquenta e trinta pesos por programa. Os mais sofisticados são coloridos, com uma foto de nu frontal ao centro, acompanhada de mais três fotos menores, em poses variadas, na lateral direita. No topo do panfleto destaca-se: “Placer extremo”. Os contatos de telefone vêm acompanhados de um endereço virtual. Nestes casos, a tarja em destaque adverte: “fotos reales”.

Na categoria das autônomas verifica-se a adoção dos nomes [sejam reais ou ficticios], talvez, como forma de diferenciação. As informações são variadas, assim como as poses fotográficas, variando entre frontal ou de costas, nu total ou parcial. Entre os que recebi nas ruas do centro, pode-se ler: “Naty – Promo $40 – cumplo todos tu fantasias”; “Carla – dos amigas em su depto. – Hoteles/Domicilio – Frigobar sin Cargo”; apenas “Alison”; e, apenas “Abril”. Em todos desta modalidade o endereço é completo, destacando nome da rua e número do imóvel. Em todos também se destacam o número do telefone fixo em letras garrafais, e um outro acrescido do numeral 15 [provavelmente correspondente ao DDD local]. As fotos são sempre acompanhadas pela legenda “fotos reales” ou “fotos 100% real”. Nestes também se destaca a advertência sobre a Ley 250.


Outra modalidade de material de divulgação poderia se classificada como categoria de panfletos mais discretos. Nesses as fotos das modelos são substituídas por imagens de cunho erótico, incluindo-se: saltos altos, maçãs, taças de champagne e/ou beijos de batom. Enquanto alguns destacam: “Discrecion, Estilo y Buen Nivel – Todo Para Vos”, outros salientam: “Vip – 24 hs.”. Chama ainda atenção a advertência em negrito: “Prohibido Menores de 18 años”. Também são destacados os números de telefones fixos e a advertência da Ley 250. Um dos panfletos da categoria discretos chama a atenção pela frase: “Dulce Masajes...”, acompanhada por tarjetas com valores que variam entre $ 20 a $ 40.

Durante minha incursão pelo mercado do sexo portenho não consegui grande informações sobre como se estabelece a prostituição masculina, ou ainda as estratégias utilizadas pelas travestis. Os poucos dados colhidos, devido principalmente a invisibilidade inerente as duas categorias, constam apenas como sinalizadores de um mercado homoerótico que inclui bares, saunas, boates e casas de shows eróticos, divulgados em guias distribuídos em espaços específicos e na internet. Isso me revela a necessidade da definição de estratégias que nortearão meu campo de pesquisa. É um novo desafio que exige atenção, sensibilidade e cuidados a um pesquisador estranho em terras estranhas. Mas isto é só o início de um novo começo, ou recomeço de um trabalho que exige tempo e perseverança. Agora, é esperar janeiro para cair em campo.

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