quinta-feira, 12 de abril de 2012

RECIFE

SOU DE RECIFE, SEU MOÇO
Epitacio Nunes
 
Se me perguntar de onde sou, bato no peito e digo: sou daqui mesmo, seu moço!
Da cidade onde o mar se arrebenta nas pedras complexas de vidas.
Das favelas repletas de vigas.
De palafitas suspensas sobre as marés.
Dos velhos sobrados e mucambos.
Das casas históricas, com ou sem eiras e beiras.
De morros e ribanceiras.
Das palmeiras onde conta o sabiá.
Sou daqui mesmo, seu moço!
Nativo das ilhas interligadas por pontes que se sobrepõem aos rios.
Da Veneza brasileira onde atracaram navios.
Que trouxeram estrangeiros de todos os cantos.
De onde os negros entoaram seu canto.
E encheram a cidade de luz para nos fazer multiétnicos e multiculturais.
Tenho origem mestiça e sou nordestino.
Não sou de além mar e nem dali.
Simplesmente sou daqui.
Sou assim mesmo, seu moço, e desde menino.
Mistura de mundos e fundos, de tudo e de todos.
Múltiplos em essência.
Junção de três raças, multiplicadas em cores.
União dos quatro elementos transformados em odores.
Atrevidos como a água que abranda o fogo, mas também mansos como o ar que percorre terras socadas.
E das mãos do Mestre Vitalino, saímos da terra molha.
Temos a pele suada, salgada no mar e dourada no sol.
Herdamos a beleza dos antepassados.
Fizemos a força nos braços.
Abrimos ruas ao Príncipe, à Princesa, à Imperatriz e ao Imperador de sangue azul.
Criamos terreiros para os Reis e as Rainhas do maracatu.
Construímos a Palmares de Zumbi.
Defendemos as florestas e matas de Tupan.
E olha seu moço, se nosso sangue é quente é devido à dor das guerras travadas.
E foram tantas as batalhas, que nem cabem nos dedos das mãos.
Acho até que essa gente daqui inventou a revolução.
Por isso quando me perguntam de onde sou, bato no peito e digo: sou daqui mesmo, seu moço!
Parente de Holanda e irmão de Olinda.
E das ladeiras gritei: Oh, que cidade mais linda, onde nasceu a primeira República.
Pela qual tombou Padre Roma, enforcaram Frei Caneca e mataram Abreu e Lima.
Mas também teve batalha nos Montes Guararapes, revolta nos Afogados e luta em Itputinga.
Por isso seu moço, não por acaso somos o Leão do Norte.
E não sem motivos nosso brado se fez forte.
Porque nunca contamos com a sorte.
Mas pela terra, seu moço, ofertamos a própria morte.
E se o sol castiga o corpo, a gente levanta cedo.
Pois é na marra que a gente vence o medo.
É no grito que a gente ganha à guerra.
Foi na força que moldamos a terra.
Terra de Lampião e Maria Bonita.
Da morte de João Pessoa.
Onde Maurício de Nassau fez o boi voar.
Até o “Zepelim”, um dia, seu moço, resolveu aparecer por cá.
E saiba que nestas ruas que por ora pisas já desfilaram a Rainha e autoridades.
O Galo da Madrugada, o Homem da Meia Noite e o Bloco da Saudade.
Temos as mais velhas e belas cidades.
Lugar onde nasceu a sobriedade e se forjou o caráter de homens fortes.
Por isso, seu moço, se me perguntar de onde sou, bato no peito e digo:
sou da terra do grande Paulo Freire e Miguel Arraes.
Do Francisco Brennant , Manoel Bandeira e muito mais.
Morada de Gilberto Freyre e de João Cabral de Melo Neto.
Destino dos tantos Severinos e Severinas.
Das edificações de Joaquim Cardoso, sem iguais, como as campinas.
Da sensibilidade de Ariano Suassuna à irreverência de Hermilo Borga Filho;
Da melodia de Luiz Gonzaga à sabedoria de Luiz Inácio Lula da Silva.
Todo filho do nordeste conta, canta, escreve e encanta suas sinas.
E até mesmo o Jomar Muniz de Brito com sua língua ferina,
ressalta as belezas da “cidade menina dos olhos de mar”.
E saiba seu moço, foi daqui que nasceram os versos de Carlos Pena Filho,
Ascenso Ferreira, Levinto e Capiba, que tanto encanta os carnavais.
Aqui também brincou Clarisse Lispector que encantou seus quintais.
Somos o berço dos maracatus, caboclinhos, samba e afoxé.
Somos da terra que ferve ao som de Alceu Valença, Lenine, Chico Science, Lia de Itamaracá e André. Somos o povo que dança o forró de pé de serra, coco de roda, ciranda e baião.
Acima de tudo seu moço, somos da terra do inesquecível Gonzagão.
Por fim, seu moço, se deseja saber mais, bata no peito e abra os braços.
Seja bem vindo à terra dos arrecifes de corais.

Texto apresentado na abertura do II Encontro Brasileiro de Geoprocessamento
Eletrobras/Chesf - 12 e 13.04.2011

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